Rádio de galena, déc. 1920 Fotógrafo não identificado

FASE DE IMPLANTAÇÃO

A história do rádio no Brasil começa antes da primeira transmissão oficial. No começo do século XX, a elite cultural e econômica do país, acompanhando a tendência internacional, já se aventurava na radiodifusão através dos primeiros aparelhos, os rádios de galena. A dificuldade na captação e a potência baixa do sistema de transmissão tornavam a atividade complexa. Ainda não existiam emissoras no país, então os radiófilos captavam sinais variados, como irradiações de navios ou de estações telegráficas. Nesse contexto, surgiram os primeiros clubes de radioamadorismo. A cobrança de um valor mensal para a associação e o custo do aparelho tornavam a atividade limitada à elite, e a programação era restrita a o que esses indivíduos identificavam como cultura. Enfatizando o caráter educativo, eram transmitidos conferências, saraus e concertos. A limitação do mercado não atraía anunciantes e, com isso, as emissoras eram desfeitas rapidamente. A profissionalização das emissoras ocorreu nas décadas de 1920 e 1930 junto à chegada das primeiras agências estrangeiras de publicidade. Com o objetivo de alargar a base de consumidores, a programação das emissoras passou a incluir estilos musicais populares e transmissões de futebol. A estratégia era tornar o rádio um elemento indispensável nos lares brasileiros.

Rádio, déc. 1930 - Fotógrafo não identificado - Coleção MIS - Acervo FMIS/RJ


1917

Publicada a lei n. 3.296, de 10 de julho, na qual declara-se de exclusiva competência do Governo Federal os serviços radiotelegráfico e radiotelefônico no território brasileiro, preocupando-se com o risco da utilização do rádio como instrumento de espionagem no contexto da I Guerra Mundial. A norma lança as bases da radiodifusão no país.


1919

No estúdio da Rádio Sociedade, localizado na Rua da Carioca, Beatriz Roquette-Pinto transmite programa infantil, 1931 - Fotógrafo não identificado - Coleção Luiz Carlos Saroldi - Acervo FMIS/RJ

Fundação do Rádio Clube de Pernambuco, o primeiro rádio clube do país, cujo objetivo era fomentar o estudo das transmissões telegráficas e telefônicas sem fio.

AUGUSTO JOAQUIM PEREIRA

Augusto Joaquim Pereira foi um radiografista. Pesquisador da radiotelegrafia sem fio, organizou o encontro na Escola Superior de Eletricidade no qual fundou junto a outros amadores a Rádio Clube do Recife.

Fotos

Você Sabia?

Ainda existe uma disputa na história do rádio em relação ao seu início. Afinal, quem foi a entidade que instalou a primeira estação: o Rádio Clube de Pernambuco ou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro? A questão é colocada pois, para definir uma estação de rádio, é necessário saber com que frequência eram transmitidos os conteúdos sonoros em ampla escala. Mesmo com incertezas, é importante marcar que pesquisas apontam para o Rádio Clube de Pernambuco como marco inicial dos rádios clubes.


1922

O Presidente Epitácio Pessoa posa para foto ao lado do Prefeito Carlos Sampaio, durante visita às obras da Exposição Internacional do Centenário da Independência, 1922 Augusto Malta - Coleção Augusto Malta - Acervo FMIS/RJ

Inauguração da Exposição Internacional do Centenário da Independência, em 07 de setembro, no Rio de Janeiro. O discurso de abertura proferido pelo presidente Epitácio Pessoa foi a primeira transmissão oficial de rádio no país, que incluiu a irradiação da ópera O Guarany, apresentada simultaneamente no Theatro Municipal da cidade.

Foi, sem dúvida, a nota mais interessante das festas comemorativas do nosso centenário, a instalação dos telefones alto-falantes [...]. A marcha dos soldados, as vozes de comando, os discursos da inauguração da exposição e até as palestras do presidente com as altas autoridades eram transmitidas para o público pelos dois fones, aglomerando-se os populares em redor dos mesmos, para ouvirem, nos seus mínimos detalhes, tudo o que se passava no pavilhão das festas, na ocasião da cerimônia inaugural.
(TELEFONE alto-falante. O Jornal, Rio de Janeiro, 8 set. 1922).


OUÇA A TRANSMISSÃO

Ópera "O Guarani", 1976
Carlos Gomes (compositor), Orquestra Sinfônica de São Paulo (intérprete), Armando Belardi (regente)
Coleção Discoteca Pública Dist. Fed.
Acervo FMIS/RJ

Fotos

Video

Várias cenas da Exposição Internacional do Centenário da Independência; visitantes; baía da Guanabara; parque de diversões; hidroavião; imagens de tratores; tração-animal; desmatamento de floresta, 1922 - Jurandyr Noronha - Coleção Jurandyr Noronha - Acervo FMIS/RJ

Você Sabia?

A transmissão de 1922 foi possível devido à implantação de duas pequenas estações, na Praia Vermelha e no Corcovado, onde localizavam-se dois transmissores de 500 watts fornecidos pelas empresas norte-americanas Westinghouse e Western e instalados em parceria com a Light e a Cia. Telefônica Brasileira. Apenas 80 receptores espalhados na capital, em Niterói e em Petrópolis acompanharam a transmissão experimental. As estações deveriam ser desinstaladas ao final da Exposição, em 1923, e a rádio sairia do ar se Roquette Pinto não tivesse apresentado ao governo seu projeto de radiodifusão.

Homens posando no alto do Morro do Corcovado. Destaque para antena de rádio-telefonia, 1922 - Augusto Malta - Coleção Augusto Malta - Acervo FMIS/RJ
Estação transmissora instalada no pavilhão da antiga Repartição Geral dos Telégrafos, na Praia Vermelha, 1922 - Fotógrafo não identificado - Acervo Agência O Globo

Roquette Pinto

Edgard Roquette Pinto (1884 - 1954) foi um polímata e integrou inúmeros círculos da intelectualidade do início do século XX. Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da Academia Brasileira de Ciências, da Sociedade de Geografia, da Academia Nacional de Medicina, da Associação Brasileira de Antropologia e de inúmeras outras associações culturais, nacionais e estrangeiras. Nesses círculos, disseminou a crença no poder da radiodifusão como elemento do progresso nacional e reuniu os entusiastas na fundação da primeira emissora oficial brasileira.

No começo de 1923, desmontava-se a estação do Corcovado e a da Praia Vermelha ia seguir o mesmo destino se o governo não a comprasse. O Brasil ia ficar sem rádio. Resolvi interessar no problema a Academia de Ciências. [...] E foi assim que nasceu a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro.
Roquette Pinto

Roquette Pinto em sua casa na Beira-Mar ouvindo seu inseparável rádio de cristal de galena, déc. 1950 - Fotógrafo não identificado - Acervo Fiocruz

1923

Fundação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro por Edgard Roquette Pinto e Henrique Morize a partir da iniciativa da Academia Brasileira de Ciências. De caráter educacional, a rádio veiculava conteúdos como aulas de idiomas e informações de saúde pública.

RENATO MURCE

Renato Floriano Murce (1900 - 1987) foi um dos pioneiros do rádio no Brasil. Contribuiu à fundação da Rádio Sociedade ao congregar associados para a emissora e onde, em 1924, lançou um programa sobre ópera e realizou concertos líricos. Com grande conhecimento da música regional, em 1930 venceu o concurso do Diário Popular que escolheu o Príncipe dos Cantores Regionais do Brasil. Entre 1930 e 1980, como integrante da Rádio Nacional, comandou uma série de programas de sucesso, como “Piadas do Manduca”, “Almas do sertão” e “Papel carbono”, considerado o primeiro programa de calouros do rádio. Lá, revelou grandes artistas nacionais como Luiz Gonzaga, Baden Powell e Chico Anysio.


Você Sabia?

As rádios educadoras surgiram num contexto em que as políticas de educação estavam sendo largamente discutidas e que culminou com a fundação da Associação Brasileira de Educação em 1924. Os objetivos do movimento de reformulação da educação brasileira baseavam-se no ideal de universalização do ensino primário leigo, obrigatório e gratuito.

A partir de agora, todos os lares espalhados pelo imenso território do Brasil receberão livremente o conforto moral da ciência e da arte pelo milagre das ondas misteriosas que transportam, silenciosamente, no espaço, as harmonias
Roquette Pinto, 1923


1924

Estreia Rádio Sociedade da Bahia, 24 de março.

Primeira transmissão da Rádio Clube Paranaense, em 27 de junho.

LÍVIO MOREIRA

Lívio Gomes Moreira (1876 - 1946) é considerado o primeiro radioamador brasileiro. Foi telegrafista-chefe na empresa Telégrafos de Curitiba e construía seus próprios equipamentos. Em 1909, criou o "Detector Lívio", um teclado alfabético que recebia vibrações da telegrafia sem fio. Realizou a primeira comunicação radiotelegráfica entre amadores do Brasil no mesmo ano, quando executou uma transmissão de aproximadamente dois quilômetros. Como diretor técnico, foi um dos sócios fundadores da Rádio Clube Paranaense.

Inauguração da Rádio Clube do Brasil, em 1º de outubro. Fundada por Elba Dias, foi a segunda rádio do Rio de Janeiro.

Arnaldo Amaral, locutor da Rádio Clube do Brasil, posa para foto em close, 1930 - 
        Fotógrafo não identificado - 
        Coleção Jacob do Bandolim - 
        Acervo FMIS/RJ
Arnaldo Amaral, locutor da Rádio Clube do Brasil, posa para foto em close, 1930 - Fotógrafo não identificado - Coleção Jacob do Bandolim - Acervo FMIS/RJ

Publicação do Decreto nº 16.657, em 05 de novembro. A desatualização da norma de 1917, o aumento do número de emissoras e a irrupção de movimentos revolucionários no país como a Coluna Prestes, de 1924, o governo federal vê com urgência a necessidade de regulamentação. O decreto expressa o pensamento dominante entre os pioneiros da radiofonia: estabelece a liberdade de recepção e a restrição das transmissões para fins científicos, educativos e culturais. “É inteiramente prohibido propagar por broadcasting sem permissão do governo, notícias internas de caracter político” (Brasil, Decreto 16.657, de 5 de novembro de 1924).

Decreto nº 16.657, de 5 de Novembro de 1924

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1926

Inauguração da Rádio Mayrink Veiga, em 21 de janeiro, marcando o início da popularização da programação radiofônica. Pertencente ao mesmo grupo da Mayrink Veiga & Cia. de importação e instalação de receptores de rádio e telégrafos, a emissora tinha como meta conquistar novos ouvintes. A estratégia de fomento de gêneros populares como samba, marcha, maxixe, tango, valsa, foxtrote e jazz incluiu a contratação do cantor popular Silvio Caldas e a apresentação de novos artistas como Carmen e Aurora Miranda, que ali estrearam.

Fotos

ALMIRANTE

Henrique Foréis Domingues (1908 - 1980), o Almirante, foi cantor, compositor e radialista. Com Braguinha, Alvinho e Henrique Brito, formou o grupo Flor do Tempo, um dos pioneiros da música popular no Brasil e no qual Noel Rosa iniciaria sua carreira em 1929, quando o grupo é renomeado como Bando de Tangarás. Como radialista, produziu diversos sucessos, como O pessoal da Velha Guarda, com Pixinguinha, e No Tempo de Noel Rosa, uma série baseada em depoimentos e interpretações de canções do músico. Intelectual da cultura popular, constituiu um enorme arquivo que em 1965 foi adquirido pelo MIS.

CARMEN MIRANDA

Maria do Carmo Miranda da Cunha (1909 - 1955), a Carmen Miranda, iniciou sua carreira no rádio em 1928. Em 1929, com o samba "Não Vá Sim'bora", fez sua primeira gravação profissional. Em 1930, gravou "Taí, pra você gostar de mim", que vendeu 35 mil cópias no ano do lançamento. O grande sucesso na rádio impulsionou sua transição para o cinema, atuando principalmente em musicais como Alô, Alô, carnaval (1936), no qual apresenta com Aurora Miranda "Cantoras do rádio". Em 1939 iniciou suas apresentações nos Estados Unidos no espetáculo "The Streets of Paris" do qual também participaram os músicos do Bando da Lua.

Fotos

 Carmen Miranda, Aurora Miranda e o Bando da Lua em cena referente ao filme, 1936 - 
              Jurandyr Noronha - 
              Coleção Jurandyr Noronha - 
              Acervo FMIS/RJ
Carmen Miranda, Aurora Miranda e o Bando da Lua em cena referente ao filme, 1936 - Jurandyr Noronha - Coleção Jurandyr Noronha - Acervo FMIS/RJ

BANDO DA LUA

O Bando da Lua foi um conjunto vocal e instrumental pioneiro, no Brasil, na harmonização de influências norte-americana. Formado no início da década de 1930, destacou-se pelas gravações de canções carnavalescas. Iniciou no mesmo período as apresentações com Carmen Miranda e viajou com a cantora aos Estados Unidos, onde participou de oito filmes e diversos espetáculos. O grupo se dissolveu em 1955, após a morte da artista.

JACOB DO BANDOLIM

Jacob Pick Bittencourt (1918 - 1969), Jacob do Bandolim, foi um músico, compositor e bandolinista de choro. Iniciou suas apresentações nas rádios na década de 1930. É um dos responsáveis pela modernização do choro ao introduzir a sanfona e o vibrafone às apresentações. Em 1934, venceu o concurso da Rádio Guanabara, Programa dos Novos, e com a projeção passou a acompanhar os grandes artistas da época, como Noel Rosa, Augusto Calheiros e Ataulfo Alves.

Jacob do Bandolim toca seu instrumento musical em emissora de rádio, próximo ao microfone e homens não identificados, 1930 - 
          Fotógrafo não identificado - 
          Coleção Jacob do Bandolim - 
          Acervo FMIS/RJ
Jacob do Bandolim toca seu instrumento musical em emissora de rádio, próximo ao microfone e homens não identificados, 1930 - Fotógrafo não identificado - Coleção Jacob do Bandolim - Acervo FMIS/RJ
Pixinguinha ao piano, dec. 1930 - 
          Fotógrafo não identificado
Pixinguinha ao piano, dec. 1930 - Fotógrafo não identificado

PIXINGUINHA

Alfredo da Rocha Vianna Filho (1897 - 1973), artisticamente Pixinguinha, foi maestro, compositor e musicista. Integrou diversos grupos musicais como Caxangá e Oito Batutas, e possui grande influência no desenvolvimento do choro na nova tradição musical brasileira. Na década de 1930, torna-se o arranjador da RCA Victor, contribuindo com Francisco Alves, Mário Reis e Carmen Miranda.

ARY BARROSO

Ary Evangelista Barroso (1903 - 1964) foi um compositor brasileiro de música popular. No final da década de 1920, despontou no rádio nacional com os sucessos "Vou a Penha" e "Vamos deixar de intimidades", interpretados por Mário Reis. Em 1930, venceu o Grande Concurso de Música Popular, com a marchinha "Dá Nela". Compôs para o teatro musicado e foi o responsável pela trilha sonora de diversos filmes. Durante as décadas de 1940 e 1950, escreveu vários dos sucessos consagrados por Carmen Miranda no cinema. Em 1943, lança o programa A hora do calouro, na Rádio Cruzeiro do Sul, dedicado à apresentação de calouros.

Fotos

Você Sabia?

Desde 2006, o dia do radialista no Brasil é comemorado em 07 de novembro, dia do aniversário de Ary Barroso. Antes, a data era comemorada em 21 de setembro, dia no qual foi declarado pelo presidente Vargas o piso salarial da categoria em 1943.

OUÇA A TRANSMISSÃO

"Eu vou para Vila", 1931 - Noel Rosa (compositor), Bando de Tangarás (intérprete) - Coleção Braguinha
Acervo FMIS/RJ

OUÇA A TRANSMISSÃO

"Cantores do rádio", 1936 - Braguinha, Alberto Ribeiro e Lamartine Babo - Coleção Braguinha - Acervo FMIS/RJ

1927

Primeira transmissão de um jogo de futebol por rádio no Brasil, entre as seleções carioca e paulista, quando a Rádio Educadora Paulista instalou alto-falantes em lugares de grande concentração popular em São Paulo. A transmissão foi um marco das tentativas de popularização da programação num momento em que o rádio ainda era um equipamento majoritariamente das elites. Ao mesmo tempo, o rádio foi essencial à transformação do futebol em um esporte de massa.

Você Sabia?

A cobrança dos direitos autorais motivou a greve das grandes emissoras de 12 de julho de 1933, quando a Rádio Clube, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a Rádio Philips e a Rádio Educadora, entre outras, paralisaram suas transmissões em protesto.

Fotos

Início da Era eletrônica do rádio: com a conexão do aparelho de toca-discos às mesas de controle de áudio, o som não precisa mais ser captado por microfones. O avanço possibilitou produções mais sofisticadas e ágeis.


1929

Em um projeto experimental da Diretoria de Instrução Pública de São Paulo, foi instalado um aparelho de rádio receptor no Grupo Escolar Prudente de Morais que fazia parte de uma campanha pela radiodifusão escolar. Contudo, devido à falta de experiência dos professores selecionados para realizarem as emissões, o projeto foi descontinuado.


1931

Venda da Rádio Record de São Paulo a Jorge Alves Lima, João Batista do Amaral e Paulo Machado de Carvalho, representando a reestruturação do modelo de negócios das emissoras brasileiras. O novo paradigma era caracterizado pela constituição de um cast profissional e exclusivo formado por locutores populares, orquestras e ídolos da música. O jornalismo e a prestação de serviços também receberam ênfase.

Publicação do decreto no 20.047, em 27 de maio. Fundamental para as políticas públicas de comunicação no Brasil, a norma determina o aumento de potencial das antenas das transmissoras. Também estabelece a garantia dos direitos autorais veiculados e a exclusiva competência da União para concessão dos serviços.

Decreto nº 20.047, de 27 de Maio de 1931

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